Derrota de Milei faz bolsa cair, dólar subir e risco-país da Argentina passar de 1 mil pontos

Resultado pressiona governo, derruba ações argentinas e amplia incerteza sobre reformas e financiamento externo.

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Publicado em 08/09/2025 às 13:21h - Atualizado Agora Publicado em 08/09/2025 às 13:21h Atualizado Agora por Wesley Santana
Peso argentino é uma das moedas que mais se desvalorizaram no primeiro semestre de 2025 (Imagem: Shutterstock)
Peso argentino é uma das moedas que mais se desvalorizaram no primeiro semestre de 2025 (Imagem: Shutterstock)

O governo de Javier Milei teve um revés sem precedentes neste domingo (7). A Província de Buenos Aires, maior colégio eleitoral da Argentina, foi às urnas e decidiu eleger a oposição para ocupar a maior parte das cadeiras do Congresso Nacional.

A chapa do Peronismo, que inclui os partidos de esquerda, alcançou 47,2% dos votos válidos, somando 3,8 milhões de votos e elegendo 13 senadores e 21 deputados federais. Já a aliança de direita A Liberdade Avança conseguiu 2,7 milhões (33,7%), conquistando 8 cadeiras no Senado e 18 na Câmara dos Deputados.

A reação do mercado foi quase imediata depois da abertura da bolsa de valores na manhã desta segunda (8). O dólar oficial chegou ao teto superior definido pelo governo, de 1.450 pesos argentinos, com alta de 5% na comparação com a última sexta, depois de semanas registrando máximas históricas.

Há um temor do governo sobre a volta do dólar paralelo dada a escalada da moeda norte-americana. Por muito tempo, o chamado dólar blue operou com o dobro da cotação oficial, o que alimentou grande parte da crise econômica argentina.

Por isso, o risco-país superou a casa de 1,1 mil pontos, conforme dados do JP Morgan. No fechamento desta reportagem, o indicador havia recuado e operava estável em cerca de 900 pontos.

No mercado de ações, o índice Merval – que reúne as principais empresas da bolsa local – recua mais de 13% no pregão desta segunda. A maior queda é vista no banco BBVA, que vê seus papéis desvalorizarem 18,5%, para perto dos 4,6 mil pesos argentinos.

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As companhias de gás e energia também sofrem duras baixas, com Enel caindo 15,7% e MetroGas, 15,1%. Apenas uma empresa, a construtora Raghsa, opera com alta durante o dia, chegando a 2% de avanço.

Nos Estados Unidos, as ações argentinas negociadas em Wall Street também registram perdas relevantes. Os papéis dos bancos Supervielle, BBVA e Galícia estão no foco, já que acumulam recuos acima de 17% no dia na cotação em dólar.

"Esses resultados parecem aumentar a probabilidade de um cenário central de baixa no qual o mercado questiona a possibilidade de reformas contínuas e aumenta a incerteza em torno de futuras fontes de financiamento externo", disse o Morgan Stanley por meio de nota aos seus clientes.

Prevendo o mau humor, depois do resultado, o ministro da Economia se pronunciou na noite de domingo: "Nada vai mudar economicamente. Nem no fiscal, nem no monetário, nem no câmbio", disse Luis Caputo.

O presidente Milei reconheceu o resultado negativo, que classificou como um revés eleitoral. “Hoje, tivemos uma derrota clara e, se alguém quiser começar a reconstruir e seguir em frente, a primeira coisa que precisa ser aceito é o resultado. Os resultados não foram positivos, tivemos um revés eleitoral e isso precisa ser aceito”, declarou ele, ainda antes das urnas serem completamente fechadas.

Já Axel Kicillof, governador de Buenos Aires e um dos principais nomes para disputar a presidência com Milei em 2027, comemorou o resultado e disse que os eleitores frearam o governo atual. "Obrigado aos milhões de moradores de Buenos Aires, obrigado por defender a província", disse ele, junto aos seus apoiadores."Viemos comemorar que colocamos um freio no governo de Milei".

Com a prisão da ex-presidente Cristina Kirchner, Kicillof é um dos principais líderes da oposição (Imagem: Shutterstock)

Recalculando a rota

Uma vitória da oposição frente à chapa de Milei já era dada como certa em Buenos Aires, mas superou as previsões do mercado e do próprio governo. A projeção era de que os peronistas levassem até 3% a mais dos votos, mas a diferença foi quatro vezes maior, conforme os dados divulgados pela Justiça Eleitoral do país vizinho.

"Achamos que o mercado não esperava o 'empate técnico', mas também não contava com um triunfo tão amplo para o peronismo, por isso tomamos como certo que os ativos financeiros estarão sob pressão muito forte. O governo, que esperava outro resultado, será obrigado a recalcular", analisou a empresa de consultoria econômica 1816, que se especializou no cenário da capital Buenos Aires, em nota à imprensa.

Apesar da derrota, o governo ainda tem outra eleição importante em outubro, quando outras províncias definem seus legisladores. Tanto a oposição como a situação podem ampliar o número de cadeiras no Congresso com base nos outros colégios eleitorais.

No entanto, o governo se vê pressionado por vários lados, o que torna o cenário ainda mais complicado para obter maioria na Câmara e no Senado. Além de denúncias de corrupção que atingem membros da Casa Rosada, o avanço dos juros e da cotação do dólar colocam Milei em um dos piores momentos do seu mandato.

"As explicações para o resultado são múltiplas e econômicas e políticas, mas a principal conclusão é apenas uma: o resultado é um golpe que obriga o partido no poder a reagir diante das eleições nacionais de outubro. O mercado vinha operando de forma consistente com esse resultado nas últimas semanas, mas os números também estavam longe do consenso. A equipe econômica planeja manter sua estratégia de percorrer a estrada até outubro. Embora, à luz dos resultados, a ampliação da intervenção cambial e a redução das taxas reais possam ser um caminho a ser explorado", analisou a corretora Facimex Valores.