Ambipar (AMBP3) deve entrar com pedido de recuperação judicial na próxima semana
No fim de setembro, a Ambipar já havia obtido proteção emergencial contra credores.
Os investidores mais agressivos já sabem que podem perder uma parte do seu patrimônio quando apostam em ativos de renda variável. No entanto, ninguém conta que essa baixa pode reduzir a carteira de investimentos a zero.
Pois foi basicamente isso que aconteceu com quem decidiu apostar recursos nos COEs (Certificados de Operações Estruturadas) da Ambipar e da Braskem. Os produtos expostos a essas companhias perderam 93% do seu valor, deixando os investidores com grandes prejuízos.
Se o investidor aplicou R$ 1 mil em um COE com dívidas da Ambipar (AMBP3), por exemplo, esse saldo virou apenas R$ 70. Os cálculos foram informados pela XP Investimentos e pelo BTG Pactual, que são duas das corretoras que mais oferecem o produto aos seus clientes.
O que chama a atenção nestes casos é que os COE por vezes são classificados na categoria de renda fixa, o que, teoricamente, traz mais segurança aos investimentos. Apesar disso, para entregar maior rentabilidade, as gestoras precisam expor o patrimônio a algum produto de renda variável -como ações ou índices- para cumprir a promessa de rentabilidade acima da renda fixa tradicional.
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De acordo com dados da B3, no ano passado, eram mais de R$ 90 bilhões expostos a algum tipo de COE no Brasil. A maior parte desse volume está atrelado ao Ibovespa, que é o índice que mede o mercado acionário do país.
A outra parte está exposta a dívidas de companhias, como debêntures, tipo que não conta com a proteção do FGC (Fundo Garantidor de Crédito). E o problema está aí, já que a Ambipar -que passa por uma crise financeira- estava na lista dos chamados COEs de crédito.
Com o anúncio da companhia de que conseguiu uma decisão da Justiça para se proteger de dívidas, os títulos negociados no mercado secundário caíram fortemente. Os COEs seguiram o mesmo caminho e desabaram ao longo das últimas semanas.
Ainda que muitos dos investidores não entendessem o funcionamento do COE, os termos dessa categoria de investimentos preveem esse tipo de resultado. Portanto, não há muito o que fazer, restando apenas abrir reclamações sobre o assunto em organismos de proteção do consumidor.
Em levantamentos feitos pela reportagem junto a sites de reclamação, há usuários que relatam prejuízos à carteira de investimentos. Há pessoas que investiram todo o patrimônio acumulado durante a vida e agora se vê em prejuízo.
“Apliquei R$ 68 mil na COE da Ambipar, que foi sugerida pela XP Investimentos como uma aplicação de baixo risco”, relata um usuário. “Não sou especialista no assunto acreditei na consultoria, não prestei atenção de que era capital de risco. A gerência garantiu que os papéis eram bons. Um belo dia vi que esta aplicação derreteu. O banco trata o assunto como se fosse um problema meu!”, continua.
O mesmo se vê nos ativos que estavam expostos à Braskem (BRKM5), que também passa por um período de crise. Só neste ano, as ações já caíram mais de 40%, segundo dados da B3.
“Hoje, ao consultar a minha conta na XP, sou surpreendido com a liquidação do COE da Braskem sem qualquer comunicação. Este foi um COE indicado pelo meu assessor em Março/24 que em tão pouco tempo já me trouxe prejuízos”, escreveu outro. “Se a Braskem já estava enfrentando dificuldades, porque eu não fui sinalizado para poder tomar alguma ação antes desse prejuízo ? Notícias foram divulgadas meses atrás”, indagou.
Tanto a XP quanto o BTG detalham em suas respectivas páginas como funciona o investimento em COEs. No caso da corretora de Guilherme Benchimol, ela pontua que pode combinar produtos de renda fixa e variável para entregar melhores cenários aos consumidores.
“Cada COE tem suas características específicas e antes de investir, você já conhece os possíveis retornos nos diferentes cenários, o prazo para manter seu dinheiro aplicado e se há a possibilidade de resgates antecipados, que ocorrerá de acordo com as condições de mercado vigentes”, escreve.
No site da XP também há uma lista com todos os COEs disponíveis para investimentos, onde estão as empresas e o tipo de pagamento da rentabilidade. Há empresas nacionais -como Eletrobras e Minerva- e internacionais como Ford e Berkshire Hathaway.
Já o BTG deixa claro que é um produto que entrega ao investidor a segurança da renda fixa, sem dar muitos detalhes sobre os riscos da operação. “Somente com o chamado custo de oportunidade, ou seja, com a rentabilidade que o investidor poderia ganhar aplicando em produtos que acompanham a taxa básica de juros”, explica.
“Você minimiza ou elimina sua perda financeira se no vencimento o resultado do ativo investido for negativo, mas ganha se for positivo. Ou seja, um investimento que pode combinar o baixo risco da Renda Fixa e o possível ganho da Renda Variável”, continua a corretora.
Não é a primeira vez que o COE se vê envolvido em discussões no mercado de capitais. Desde o ano passado, o produto tem sido alvo de frequentes reclamações, justamente pelo seu modelo que é considerado um problema para muita gente.
Em março, a Grizzly Research classificou os COEs como um esquema de pirâmide feito por corretoras brasileiras. A casa de análises dos Estados Unidos publicou um relatório dizendo que muitas das corretoras que vendiam o produto dependiam dele para alcançar resultados financeiros satisfatórios.
Na época, a XP esteve no centro da polêmica, que fez suas ações caírem mais de 6% no pregão da bolsa de valores. A empresa brasileira, no entanto, veio a público e disse que o relatório da Grizzly se tratava de uma “notícia falsa” e que não considerava o cenário tributário brasileiro.
“O resultado das suas carteiras é fruto da atuação da XP em diversos mercados e instrumentos nos quais a companhia tem uma participação significativa, especialmente, a remuneração por serviços de formação de mercado e liquidez em diversos segmentos de indústria financeira, cobrindo tanto investidores do varejo quanto clientes corporativos e institucionais”, afirma a XP.
Grande parte da pressão do mercado sobre o ativo vem do fato de que as corretoras fazem campanhas de marketing massivas para vendê-los. Além disso, oferecem comissões acima da média de outros produtos para que agentes financeiros induzam os clientes a optar por essa categoria, que pode não ser tão vantajosa para quem contrata.
O interesse das corretoras em relação ao ativo se sustenta no fato de que elas conseguem reduzir o imposto que pagam por meio de manobras que usam o ativo. Em vez de 40%, o movimento financeiro feito por meio do COE gera apenas 15% de tributação.
No fim de setembro, a Ambipar já havia obtido proteção emergencial contra credores.
Em apenas um mês, as ações da companhia despencaram de R$ 14,10 para cerca de R$ 0,75, uma queda superior a 90% em outubro.